As eleições, período pós-eleitoral, as redes sociais e eu...
1. Estou de volta, agora na tentativa de me iniciar como "blogger" regular. Tomei essa decisão depois de muita insistência dalguns amigos (uns de amizade antiga e outros de nova, sobretudo, virtual) por terem notado a minha ausência. Tal facto (ausência) deveu-se a motivos que, em parte são pessoais, relacionados com a minha aversão ao Facebook, por considerá-lo uma ferramenta democrático-liberal demais para o meu gosto (disposição à invasão de certa privacidade) por um lado e, por outro, por me terem limitado o direito de tecer alguns comentários noutros blogs, a começar pelo meu predilecto até altura em que era possível comentar directamente, o "morrodamaianga" de Wilson Dadá, seguindo-se o "páginaglobal" e "circuitoangolanointelectual", cujos comentários jamais foram publicados, apesar dalgumas tentativas.
2. Passaram-se quase um ano então. Decido entrar justamente no período pós-eleitoral, depois do presidente da CNE ter divulgado os resultados eleitorais definitivos na última sexta-feita (07.09) confirmando a vitória do MPLA com pouco mais de 70% do total dos votos escrutinados, proporcionando-lhe 175 deputados, no cômputo geral (círculos nacional e provinciais) para a próxima legislatura, secundado pela UNITA com mais de 18% (32 deputados no total), seguindo-se a novel CASA-CE que obteve mais de 6% (8 deputados apenas pelo círculo nacional), o PRS (1,69%) que elegeu 3 deputados e a FNLA (1.08%) que conseguiu 2 assentos pelo círculo nacional. As demais formações partidárias e coligações de partido não conseguiram atingir os "mínimos" recomendados por lei.
3. Antes de debruçar-me sobre a actual fase de reclamações de irregularidades nalguns dos actos administrativos praticados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE), com possibilidade de recurso contencioso eleitoral junto do Tribunal Constitucional (TC) impulsionadas por dois partidos políticos (UNITA e PRS) e uma coligação de partidos (CASA-CE) concorrentes ao pleito de 31.08 último, ater-me-ei sobre as várias leituras já possíveis de fazer sobre o desempenho dos partidos e dos eleitores antes, durante e depois do sufrágio.
4. O período que antecedeu a votação foi marcado pelas campanhas eleitorais. Salvo alguns laivos de provocação, com direito à réplicas e tréplicas, chamo para aqui a reacção do MPLA que se queixou dos "insultos" dos seus adversários (UNITA, CASA-CE e PRS) clima próprio em ocasiões do género, a campanha ocorreu dentro dos parâmetros democráticos. Porém, não se sabe se por estratégia, ou por falta dela, alguns concorrentes da oposição, ao invés de se destacarem por discursos moderados, coerentes e "politicamente correctos", apresentaram-se com opções paradoxais, discursos musculados, anacrónicos e até inflamados (referências pejorativas e descriminatórias de Kamalata Numa sobre os "crioulos" e origem de certos dignitários com destaque para o cabeça de lista do MPLA).
5. Sinceramente, a opção de Numa foi infeliz, porque caluniosa, injuriosa e difamatória, contrária a reconciliação nacional. Mas, mais infeliz foi ainda o espectro de fraude antecipada recorrentemente "radiado" pela UNITA (argumento que já cansa porque remonta desde as eleições inconclusivas de 1992 com as consequências conhecidas por quem as viveu), seguida da expectativa criada a volta do impasse a participação ou não ao pleito, na tentativa de inviabilizar o processo de votação. Essa estratégia previa igualmente a realização de manifestações. Nas vésperas da votação, Isaías Samakuva solicita uma audiência presidencial, atitude que levantou suspeições de "armadilha".
6. O período pré-votação foi ainda marcado por uma inflamação nos discursos do líder da CASA-CE (que até vinha pautando-se por uma actuação coerente) sobretudo porque voltados mais para fora do que para dentro, tal como se viu na mensagem "enviada" aos embaixadores de países ocidentais acreditados em Angola em que salientava a rejeição dos votos a serem escrutinados nas assembleias e mesas de votos em que não esteja representado por um delegado de listas. Tal atitude levou a que jovens ligados à referida coligação se dirigissem às instalações da CNE para contestar a desaprovação de alguns dos seus candidatos a delegados de lista em pleno dia reservado à reflexão (30.08). Viu-se depois que tudo foi orquestrado na vã pretensão de se criar facto político.
7. Felizmente imperou o bom-senso e tanto a CASA-CE quanto a UNITA, essa última sobretudo "in extremis", participaram da votação. Os eleitores, nas vestes de detentores do poder político a ser transferido aos seus representantes, esses sim deram uma lição aos políticos, aos angolanos, aos africanos e ao mundo de amadurecimento político e civismo inesperado. Um autêntico exemplo à Africa e ao mundo!
8. Os resultados eleitorais, além das percentagens sobre os votos conseguidos por cada concorrente, trouxeram outras verdades absolutas. Cresceram as percentagens sobre a abstenção, os votos em branco e nulos. Hoje discute-se sobre as causas, razões e dimensões dessas formas de fazer democracia, vantagens e desvantagens para os concorrentes ante aos votos não escrutinados (por abstenção e por invalidade) que, somados, perfazem uma percentagem acima dos 40%.
9. Para isso concorreram vários factores, dos quais destaco alguns a seguir:
Do ponto de vista organizacional
- Manutenção de eleitores falecidos no FICRE (cerca de 700.000).
- Cerca de 2 milhões de eleitores que não actualizaram o seu registo, tendo sido distribuídos aleatoriamente às assembleias de voto pela solução tecnológica, em função da residência de 2008.
- Ausência de urnas especiais, tal como ocorreu nas eleições de 2008.
- Recuo da CNE quanto à votação antecipada para os militares e para-militares em serviço.
- Recuo da CNE quanto ao voto no exterior.
- Indicação de assembleias de voto distante dos locais de residência.
Do ponto de vista da estratégia dos partidos
- O MPLA ignorou o crescimento da consciência crítica dos angolanos, sobretudo nos grandes cascos urbanos de Luanda e Benguela, sem descurar a "especialidade" Cabinda, fechando-se "em copas" sobre as reivindicações feitas por jovens universitários e sectores da sociedade civil que não pactuam com as suas opções.
- A oposição não foi capaz de capitalizar e puxar para si o voto dos indecisos, descontentes e desiludidos para com a governação do MPLA.
- A UNITA terá desmobilizado para a votação parte dos seus militantes e/ou simpatizantes com a tentativa de inviabilizar o processo de votação.
- A CASA-CE não conseguiu cooptar para si o voto da classe média e dos intelectuais por, a dada altura, ter baixado o nível da sua campanha (a referência "gatunos" e "ditadores" não foi bem acolhida por esses sectores).
10. Verdade seja dita, o baixo nível de escolaridade também contribuiu para a elevação dos votos inválidos, sobretudo, os nulos. Tende a aumentar o número de indignados que, mesmo deslocando-se às assembleias, vota em branco e/ou torna o voto nulo propositadamente. Dessa forma, todos os partidos, incluindo o vencedor, têm tarefas para casa até ao próximo pleito (as autárquicas estão já aqui na esquina). Até lá, nós seguiremos os passos que serão dados para a conquista do eleitorado e consolidação da democracia!
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